letras

e-ISSN: 2215-2563

Número 61E (3) Especial CLAG • Julio-diciembre 2018

Doi: http://dx.doi.org/10.15359/rgac.61-3.1

Páginas de la 23 a la 38 del documento impreso

Recibido: 9/5/2018 • Aceptado: 16/6/2018

URL: www.revistas.una.ac.cr/index.php/geografica/



Os centros regionais inovativos de tecnologia assistiva do Brasil

The regional innovative centers of assistive technology of Brazil

Los centros regionales innovadores de tecnología asistiva de Brasil

Marcus Vinícius Albrecht Anversa1

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil


Resumo

A situação do Brasil, segundo o Censo do IBGE 2010 (BRASIL, 2012), é de 23,9 % dos brasileiros apresentarem ao menos algum tipo de deficiência que se pode enquadrar como: visual, motora, auditiva ou mental. Destes, cerca de 18,6% possuem deficiência visual, 7% motora, 5,1% auditiva, e 1,4% mental. A Organização Mundial de Saúde (2011) concluiu que no decorrer da vida humana, em algum momento, ocorrerá algum tipo de deficiência, sendo a mais provável por processo de envelhecimento. Em vista deste quadro, a busca por uma sociedade mais inclusiva se tornou uma das prerrogativas das Políticas Públicas de Ciência, Tecnologia e Inovação Brasileira, principalmente a partir da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (4ª CNCTI), realizada em 2010. A determinação e estudo dos Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva, portanto, urge como necessidade em fornecer instrumentos para tais políticas.

Palavras-chaves: Centros Regionais Inovativos, Patentes, Inovação Tecnológica, Tecnologia Assistiva

Abstract

According to the IBGE Census 2010 (BRASIL, 2012), the Brazilian situation is 23.9% of Brazilians have at least some type of disability that can be classified as visual, motor, hearing or mental disabilities. Of these, about 18.6% have visual impairment, 7% motor, 5.1% auditory and 1.4% mental. The World Health Organization (2011) concluded that during human life, at some point, some type of disability will occur, being the most likely due to the aging process. In view of this situation, the search for a more inclusive society has become one of the prerogatives of the Brazilian Science, Technology and Innovation Public Policy, especially since the 4th National Conference on Science, Technology and Innovation (4th CNCTI) held in 2010.The determination and study of the Innovative Regional Centers for Assistive Technology, therefore, urgently needs to provide instruments for such policies.

Keywords: Innovative Regional Centers, Patents, Technological Innovation, Assistive Technology

Resumen

Según el Censo del IBGE 2010 (BRASIL, 2012), el 23,9% de los brasileños presentan al menos algún tipo de discapacidad como: visual, motora, auditiva o mental. De ellos, cerca del 18,6% poseen deficiencia visual, 7% motora, 5,1% auditiva y 1,4% mental. La Organización Mundial de la Salud (2011) concluyó que en el transcurso de la vida humana, en algún momento, ocurrirá algún tipo de deficiencia, siendo la más probable por proceso de envejecimiento. En vista de este panorama la búsqueda por una sociedad más inclusiva se ha convertido en una de las prerrogativas de las Políticas Públicas de Ciencia, Tecnología e Innovación Brasileña, principalmente a partir de la 4ª Conferencia Nacional de Ciencia, Tecnología e Innovación (4ª CNCTI), realizada en 2010. La determinación y estudio de los Centros Regionales Innovadores de Tecnología Asistiva, por lo tanto, urge como necesidad en proveer instrumentos para tales políticas.

Palabras claves: Centros Regionales Innovadores, Patentes, Innovación Tecnológica, Tecnología Asistiva

Introdução

Tecnologia Assistiva (TA) é uma expressão recente referente a um conceito ainda em pleno processo de construção e sistematização. A utilização dessa tecnologia poderia se dizer que remonta aos primórdios da história da humana, ou até mesmo da pré-história. Qualquer pedaço de pau utilizado como uma bengala improvisada, por exemplo, caracteriza o uso de um recurso de Tecnologia Assistiva.

Como afirma José Eduardo Manzini (2005)

Os recursos de tecnologia assistiva estão muito próximos do nosso dia a dia. Ora eles nos causa impacto devido à tecnologia que apresentam, ora passam quase despercebidos. Para exemplificar, podemos chamar de tecnologia assistiva uma bengala, utilizada por nossos avôs para proporcionar conforto e segurança no momento de caminhar, bem como um aparelho de amplificação utilizado por uma pessoa com surdez moderada ou mesmo veículo adaptado para uma pessoa com deficiência. (MANZINI, 2005, p.82)

A expressão Tecnologia Assistiva foi criada em 1988 como elemento jurídico dentro da legislação estadunidense para garantir o benefício de recursos e serviços favorecedores de uma vida mais independente, produtiva e incluída no contexto social (BERSCH, 2013). Portanto, o termo surge com abrangência em duas dimensões: recursos, que são os equipamentos, produtos ou sistemas, e serviços, destinados a auxiliar diretamente às pessoas com deficiência a selecionar, adquirir ou usar os recursos de TA. Entretanto, existe uma tendência equivocada em considerar como TA qualquer recurso relacionado a pessoas com deficiência, mesmo que este possa ser usado por pessoas sem deficiência com as mesmas finalidades.

Em vista ao exposto, optamos neste trabalho em definir o conceito de TA, ainda em evolução, o proposto por Teófilo Galvão Filho (2013) como

[...] um tipo de mediação instrumental, está relacionada com os processos que favorecem, compensam, potencializam ou auxiliam, também na escola, as habilidades ou funções pessoais comprometidas pela deficiência, geralmente relacionadas às funções motoras, funções visuais, funções auditivas e/ou funções comunicativas.

Nas Políticas Públicas de Ciência, Tecnologia e Inovação do Brasil têm algumas aplicações ligadas à inovação de cunho social. O Comitê de Ajudas Técnicas (CAT), instituído pela Portaria N° 142, de 16 de novembro de 2006, propõe o seguinte conceito para a Tecnologia Assistiva sendo

[...] uma área do conhecimento, de característica interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social (ATA VII - Comitê de Ajudas Técnicas (CAT) - Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE) - Secretaria Especial dos Direitos Humanos - Presidência da República).

Os Núcleos de Pesquisa em Tecnologia Assistiva

Buscando a implementação das Tecnologias Assistivas foram criados os Núcleos de Pesquisa em Tecnologia Assistiva. Essas unidades são responsáveis pela elaboração de projetos de pesquisa, desenvolvimento ou inovação voltados à melhoria da qualidade de vida de pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Em 2012, o orçamento liberado para a implantação dos núcleos foi de R$ 3 milhões. Os núcleos, portanto, fazem parte de um esforço para disseminar as pesquisas de Tecnologia Assistiva para todo o território brasileiro. Este estímulo é importante porque a produção é quase artesanal, já que o equipamento deve ser adaptado a cada usuário, dificultando a produção em escala. Os núcleos atuam em rede, cuja articulação é realizada por um centro de referência, o Centro Nacional de Referência em Tecnologias Assistivas (CNRTA), localizado no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), em Campinas (SP). Em janeiro de 2017 tínhamos os seguintes 52 Núcleos de Pesquisa em Tecnologia Assistiva, conforme podemos ver no quadro 1.

Quadro 1 - Núcleos de Pesquisa em Tecnologia Assistiva, 2017

UF

INSTITUIÇÃO

SIGLA

AM

Instituto Federal do Estado do Amazonas

IFAM

AM

Universidade do Estado do Amazonas

UEA

AM

Universidade Federal do Amazonas

UFAM

AP

Universidade Federal do Amapá

IFAP

BA

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

UFRB

CE

Instituto Federal do Ceará

IFCE

CE

Universidade Federal do Ceará

UFC

DF

Instituto Federal de Brasília

IFB

DF

Universidade de Brasília

UNB

ES

Instituto Federal do Espirito Santo

IFES

ES

Universidade Federal do Espirito Santo

UFES

GO

Universidade Federal de Goiás

UFG

MG

Universidade Federal de Lavras

UFLA

MG

Universidade Federal de Minas Gerais

UFMG

MG

Universidade Federal São Joao Del-Rei

UFSJ

MG

Universidade Federal de Uberlândia

UFU

MG

Universidade de Viçosa

UFV

MG

Universidade Federal de Alienas

UNIFAL

MS

Universidade Católica Dona Bosco

UCDB

MS

Universidade Federal da Grande Domados

UFGD

PA

Instituto Federal do Para

IFPA

PA

Universidade do Estado do Pari

UEPA

PA

Universidade Federal Rural da Amazônia

UFRA

PB

Universidade Federal da Paraíba

UFPB

PE

Universidade Federal de Pernambuco

UFPE

PR

Instituto Federal do Paraná

IFPR

PR

Pontifícia Universidade Católica do Paraná

PUC-PR

PR

Universidade Estadual do Norte do Paraná

UENP

PR

Universidade Federal do Paraná

UFPR

PR

Universidade Tecnológica Federal do Paraná

UTFPR

RJ

Instituto Nacional de Tecnologia

INT

RJ

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

PUC-RIO

RJ

Universidade Federal Fluminense

UFF

RJ

Universidade Federal do Rio De Janeiro

UFRJ

RN

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

UFRN

RR

Universidade Federal de Roraima

UFRR

RS

Centro Universitário Feevale

FEEVALE

RS

Instituto Federal do Rio Grande do Sul

IFRS

RS

Universidade de Caxias do Sul

UCS

RS

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFRGS

SC

Instituto Federal de Santa Catarina

IFSC

SC

Universidade Federal de Santa Catarina

UFSC

SC

Centro Universitário Leonardo da Vinci

UNIASSELVI

SC

Universidade do Vale do Itajaí

UNIVALI

SE

Universidade Federal de Sergipe

UFS

SP

Universidade Federal do ABC

UFABC

SP

Universidade Federal de São Carlos

UFSCAR

SP

Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita FilHo

UNESP

SP

Universidade Estadual de Campinas

UNICAMP

SP

Universidade Camilo Castelo Branco

UNICASTELO

SP

Universidade Federal de São Paulo

UNIFESP

SP

Universidade de São Paulo

USP

Fonte: CNRTA /CTI, 2017.

Os Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva do Brasil

Temos como base para a definição de Centro Regional Inovativo de Tecnologias Assistiva do Brasil, embora no caso brasileiro os seus Sistemas de Inovação ainda estejam imaturos, um similar ao proposto por Marcus Anversa (2017) para os “Centros Regionais Inovativos”. Este o definiu através da agregação dos correspondentes à "Milieux Inovador", do GREMI fundado por Philippe Aydalot em 1984, atual GERI (Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Inovação), aos de Sistemas de Inovação Regionais (incluso o de Regiões de Aprendizagem2), que se originam dos Sistemas de Inovação Nacionais, com forte ligação com a Teoria da Economia Evolucionária, na quais as inovações produzidas sob essa perspectiva distinguem-se pela interação entre diversos atores, pelo caráter cumulativo do conhecimento e pela especificidade do processo de P&D.

Temos, então, o Centro Regional Inovativo de Tecnologia Assistiva como o [Território que possui um conjunto de elementos materiais (recursos humanos, empresas, ICTs, infraestrutura), imateriais (conhecimento, fluxos informacionais) e institucionais (regras e arcabouço legal) compondo complexas redes de relações voltadas para as inovações nas quais são produzidas pela interação destes diversos atores, pelo caráter cumulativo do conhecimento e pela especificidade do processo de P&D que acabam caracterizando a sua expertise em Tecnologia Assistiva]. Para a determinação dos Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva neste trabalho é imprescindível a existência de NITs em funcionamento nas Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) que também possuam um Núcleo de Pesquisa em Tecnologia Assistiva ligado à rede do Centro Nacional de Referência em Tecnologias Assistivas (CNRTA).

Um Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT) é definido na Lei N. 10.973, de 02/12/2004, conhecida como Lei de Inovação Tecnológica, como sendo o núcleo ou órgão constituído por uma ou mais Instituição de Ciência e Tecnologia (ICT) com a finalidade de gerir sua política de inovação. Há diferentes modelos de NIT e dependem das especificidades de cada ICT ou consórcio de ICT e dos mecanismos de transferência de tecnologia utilizados por elas. Os NITs são a expressão baseada na visão que norteia as políticas tecnológicas realizadas em vários países com o foco em programas de cooperação entre os setores público e privado, buscando incentivar e apoiar os esforços das empresas, reduzir riscos e maximizar os resultados da capacitação científica formada localmente (LOTUFO, 2009). O autor ressaltou que esses esforços, além de estimular parcerias entre universidades, institutos de pesquisa e empresas, estão direcionados à maior interação entre as próprias empresas, seja por meio de políticas explícitas ou através de “redes cooperativas” de pesquisa, centros compartilhados e/ou infraestruturas comuns. A Lei da Inovação Tecnológica em seu Artigo 17 determina que: “A ICT deverá dispor de Núcleo de Inovação Tecnológica, próprio ou em associação com outras ICT, com a finalidade de gerir sua política de inovação” (BRASIL, 2004).

Para a determinação de cada Centro Regional Inovativo de Tecnologia Assistiva foram aferidos os seus pedidos de patentes, como demonstra o quadro 2. Na delimitação da região, a escala é a municipal e sua área de influência. Os Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva identificados são os que possuem ICTs com NITs cadastrados no Formulário para Informações sobre a Política de Propriedade Intelectual das Instituições Científicas e Tecnológicas do Brasil (FORMICT) 2015, ano base 2014, e pelo Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (FORTEC) em 2013, além de conterem um Núcleo de Pesquisa em Tecnologia Assistiva articulado à rede do CNRTA em janeiro de 2017. O recorte temporal para a apuração dos pedidos de patentes dos referidos NITs foi de 01/01/2006 a 19/07/2017. As buscas realizadas no Banco de Dados de Dados de Patentes do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) foi estabelecido através do uso das seguintes palavras-chaves: deficiência visual, deficiência auditiva, deficiência comunicativa, cadeirante, mobilidade e tecnologia assistiva. Todas as buscas com as devidas análises de estarem qualificadas como patentes de Tecnologia Assistivas, além de evitar a redundância dos dados.

Quanto ao uso de dados quantitativos das patentes temos que atentar na existência de algumas limitações que devem ser observadas, como bem afirmou Zvi Griliches (1990, p. 296). Primeiramente, nem toda invenção é patenteada, pois para patentear uma invenção é necessário tornar público os detalhes referentes a ela e consequentemente, algumas empresas preferem manter em segredo os detalhes técnicos e decidem não patentear. Outra limitação refere-se à impossibilidade de avaliar a qualidade de cada patente. Assim, mesmo não possuindo o mesmo valor econômico, elas são contadas de forma igual. O fato é que nem toda patente é uma inovação. Em geral, de cada 100 patentes concedidas, somente algumas se tornarão inovações, isto é, para uso no mercado. Como atesta Eduardo Albuquerque (2000), estas limitações, no entanto, não impede que as patentes sejam consideradas uma importante fonte sobre atividades tecnológicas em um sistema de inovação. Nesta ótica, a geração de pedidos de patentes de cunho tecnológico, no nosso caso, as de TA, representam um bom indicador, em termos quantitativos, o mais utilizado para aferir a produção tecnológica de dado local, além de demonstrar a prova material e cabal dos resultados de parcerias e interações entre ICTs e empresas na realização de projetos de P, D & I.

Quadro 2. Quantidade de pedidos de patentes nos Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva no período de 01/01/2006 a 19/07/2017

Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva

Pedidos de Patentes

ICT/Quantidade de Patentes

Região Norte

Manaus

1

UFAM(l)

Região Nordeste

Fortaleza

1

IFCE (1)

João Pessoa

1

UEPB (1)

Região Centro-Oeste

Brasília

1

UNB (1)

Região Sudeste

Alfenas

1

UNIFAL(l)

Belo Horizonte

1

UFMG (1)

Campinas

4

CTI (4)

Rio de Janeiro

3

INT (3)

Santo André

1

UFABC (1)

São Carlos

1

UFSCAR (1)

São Paulo

1

USP (1)

Uberlândia

1

UFU(l)

Vitória

1

IFES (1)

Região Sul

Florianópolis

1

IFSC (1)

Novo Hamburgo

1

FEEVALE (1)

Porto Alegre

1

IFRS (1)

Fonte: Banco de Dados de Patentes - INPI, 2017; CTI, 2016. Organizado por Marcus Anversa, 2017.

Foram também apuradas algumas ICTs com NITs implementados que ainda não aderiram à rede do CNRTA até janeiro de 2017, mas que realizaram pedidos de patentes de Tecnologia Assistiva no período do recorte temporal da pesquisa. São elas, com o seus respectivos quantitativos: SOCIESC (1), CERTI (1), PUC-SP (1), SENAI RJ (2) e SENAI SP (2).

De acordo com o quadro 2, apresenta-se como um dos principais Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva do Brasil o localizado em Campinas - SP, no qual se encontra o articulador da rede de Núcleos de Pesquisa em Tecnologia Assistiva, isto é, o CNRTA, localizado no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI). O destaque do Centro Regional Inovativo de Tecnologia Assistiva de Campinas é devido o território dispor de abundante capital de risco que o consolida em se tornar um dos maiores centros tecnológicos do país nas quais as ICTs nele localizadas tendem a produzir mais resultados a serem partilhados. De fato, este Centro se encontra no eixo econômico-tecnológico do Brasil (Rio de Janeiro-Campinas).

Na figura 1 percebe-se que os inventores independentes são os principais depositantes de patentes de tecnologia assistiva no Brasil no recorte temporal estabelecido, correspondendo à 64%, seguido pelas empresas, 20% e pelas ICTs, 16%%. Foi notado que o investimento em tecnologias assistivas para a mobilidade de pessoas com deficiência não está concentrado em grandes empresas, mas sim nos inventores independentes, o que transparece que o público dessa demanda não é o foco destas empresas. Esta situação transparece a falta de comunicação/conexão entre os inventores independentes, também das ICTs, com as empresas, estas responsáveis em tornar os inventos em inovações, isto é, levar a patente ser apropriada pelo sistema produtivo. Eis um bom desafio para os NITs quanto a transferência tecnológica assistiva, assim como de programas governamentais como o da Associação Empresa Brasileiras de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPII).

Figura 1. Depósitos de patentes brasileiras por categoria de inventores (01/01/2016 a 19/07/2017).

Fonte: Banco de Dados de Patentes - INPI, 2017. Organizado por Marcus Anversa, 2017.

Na verdade, o Brasil apresenta o gargalo de suas patentes ser apropriadas pelo sistema produtivo, caso semelhante às diversas nações, como Barbados, a melhor colocada da América Latina e Caribe no ranking do Índice Global de Inovação (GII) 2015e Costa Rica no GII 2013, além das demais nações menos desenvolvidas tecnologicamente localizadas na América Latina, África e grande parte da Ásia e Oceania.

Suponha-se existir nos citados Barbados e Costa Rica os encadeamentos produtivos ligados às atividades mais sofisticadas, que ajudariam no aumento da produtividade com a absorção e adaptação das novas patentes de potencial inovativo por parte de suas empresas locais. Entretanto, isto não corresponde à realidade (ANVERSA, 2015 & 2017b). Outro fato é a existência da alta porcentagem das patentes serem originadas de não residentes ou serem realizados os pedidos de proteção no exterior.

Na prática, a proporção de pedidos nacionais e estrangeiros reflete o grau de desenvolvimento tecnológico dos países. Em economias mais desenvolvidas, o equilíbrio é maior. Um dos motivos básicos para a maior quantidade de pedidos serem de estrangeiros é devido as empresas brasileiras investirem pouco em P&D. Na maior parte dos casos, empresas estrangeiras patenteiam no mercado brasileiro inovações e produtos desenvolvidos em centros tecnológicos das suas matrizes ou em outras partes do mundo. Devemos acrescentar que somado à falta de P&D local, a quantidade de empresas estrangeiras aumentou no país na segunda metade da década de 1990 atraídas pela estabilidade econômica e aumento de consumo proporcionado com a criação do Plano Real. A criação do Mercosul também influenciou nessa atração de empresas estrangeiras.

A industrialização de países como a Argentina, México, Brasil, entre outros, se fez com forte presença de empresas estrangeiras, as quais não internalizaram seus esforços de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P, D&I) em suas plantas dos respectivos países, usando a América Latina como parâmetro. Isso limitou a eficácia de geração de capacitação tecnológica e de processos inovativos que assegurem aptidão para competir nos mercados globais e na integração produtiva entre os mesmos (CAMPOLINA & DINIZ, 2013). Eis o gargalo que enfrentam as patentes brasileiras, aumentado com as relacionadas às tecnologias assistivas, em alcançarem o sistema produtivo, sendo as últimas não estarem no foco principal das grandes e médias empresas localizadas no país.

Na ótica dos Centros Regionais Inovativos de Tecnologia Assistiva percebe- se que o desenvolvimento econômico está intimamente ligado à capacidade interna de seus agentes, isto é, elementos materiais (empresas, ICTs, infraestrutura), imateriais (conhecimento, fluxos informacionais) e institucionais (regras e arcabouço legal), no apoio à atividade inovativa. Acrescenta-se ainda que a desigualdade existente entre as estruturas de suporte à inovação nas Macrorregiões do Brasil (divisão regional oficial do Brasil estabelecida pelo IBGE) levam a figurar como um novo mecanismo indutor da concentração socioespacial da renda, propiciando que as macrorregiões Sudeste e Sul, possuidoras de melhores condições de sustentar a inovação tecnológica, entre elas as assistivas, o desenvolvimento cada vez mais, quantitativamente e qualitativamente, de novos Centros Regionais Inovativos. Isto é obtido através de dinâmicas mais aceleradas de sua boa infraestrutura em relação às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Por meio desta análise, constata-se que há uma expressiva associação entre variáveis ligadas ao desenvolvimento econômico e aquelas ligadas à estrutura tecnológica nas Macrorregiões do Brasil e seus respectivos Centros Regionais Inovativos, no nosso caso, os de Tecnologia Assistiva. Esta situação, como já exposta, ajuda a explicar o realce do Centro Regional Inovativo de Tecnologia Assistiva de Campinas, território com abundante capital de risco, em se consolidar como o maior centro tecnológico do país, nas quais as ICTs aí instaladas tendem a produzir mais resultados.

Como já notado, o presente cenário é preocupante, pois leva a uma possível perpetuação da desigualdade socioespacial, já que as regiões economicamente estruturadas e desenvolvidas tenderão a manter maior capacidade de inovar e consequentemente, maior competitividade e renda, apesar de regiões como a do Centro-Oeste estarem apresentando condições de superação deste quadro. Resultados encontrados em trabalhos comoo de Simões et al. (2005) e Marcus Anversa (2017) corroboram com a noção de que o Brasil convive ainda com um Sistema Nacional de Inovação limitado, impactando nas invenções de tecnologia assistiva, o que reflete no alto grau de concentração das indústrias empregadoras de alta tecnologia nas Regiões Sudeste e Sul. Atualmente, os editais de fomento reservam um percentual destinado apenas para os Estados das regiões menos favorecidas, justamente para tentar induzir a descentralização. Temos, então, o importante papel da ação governamental, de suas Políticas Públicas em Ciência, Tecnologia e Inovação, em atenuar tais desequilíbrios regionais.

Outro aspecto a abordar, apresentado por Maíra Corrêa (2008), é da existência de grandes dificuldades para ultrapassar as três lógicas constitutivas do perfil dos comitês gestores voltados para a inovação, na qual está incluso a social: a lógica excelentista autonomista (dos grupos hegemônicos na coletividade científica), a lógica da competitividade (empresários e gestores públicos que buscam atender aos requerimentos do mercado) e a lógica assistencial, isto é, gestores públicos que buscam resolver carências e demandas de inclusão social de forma simples e rápida sem mudanças significativas nas estruturas de educação e, mesmo, na lógica da produção e divulgação de Ciência, Tecnologia & Inovação.

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) possui uma Secretaria de Inclusão Social (SECIS), que a partir da gestão do ministro Gilberto Kassab em 2016, passou a ser designado Departamento de Políticas e Programas para Inclusão Social (DEPIS), com a função de promover a inclusão social por meio de ações que melhorem a qualidade de vida e estimulem a geração de ocupação e renda por meio do uso das Tecnologias Sociais. Até a mudança de denominação para DEPIS, era visível no site institucional do antigo MCTI, a SECIS apresentando as Tecnologias Sociais como: “Essas tecnologias caracterizam-se pela simplicidade, baixo custo e fácil aplicação, que potencializam a utilização de insumos locais e mão de obra disponível, protegem o meio ambiente, têm impacto positivo e capacidade de resolução de problemas sociais”. Segundo Maíra Corrêa (2008, p. 118), “essa perspectiva, corre o risco de restringir o conceito de Tecnologias Sociais às tecnologias de segunda classe e simples instrumento assistencialista”. A autora também apresenta a questão de haver a tendência de excluir do campo das Tecnologias Sociais todas aquelas tecnologias baseadas em desenvolvimentos científicos mais sofisticados e/ou que envolvam recursos de maior vulto.

Em 2017, o site institucional do MCTIC apresenta a DEPIS com algumas das seguintes competências em relação às tecnologias sociais:

XIV - contribuir para o desenvolvimento da Política Nacional de Tecnologia Social por meio da proposição de programas de desenvolvimento socioeconômico e de erradicação da pobreza e da miséria;

XV - estimular e apoiar projetos e ações no âmbito da Política Nacional da Pessoa com Deficiência que propiciem a interação de instituições de pesquisa com o setor produtivo e a formação de redes interinstitucionais para o desenvolvimento de produtos, serviços e tecnologias na área de tecnologia assistiva;

Conclusão

Ao finalizarmos este trabalho, conclui-se haver maiores debates sobre as formas que vêm assumindo as Políticas Públicas de Ciência, Tecnologia e Inovação do Brasil, nas quais envolvam as relações entre Estado, coletividade científica e sociedade, ampliando os estudos e discussões, entre eles, sobre as Tecnologias Assistivas. Uma das ações através de Políticas Públicas visando a remediação dos efeitos das desigualdades socioespaciais proporcionados pelas inovações tecnológicas seria o incremento dos Centros Regionais Inovativos, entre eles, os de Tecnologia Assistiva, ainda embrionários, como os de Fortaleza, João Pessoa e Manaus, além do fomento na constituição de novos nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Esta ação proporcionaria que muitos dos inventos/patentes de qualificação assistiva estejam disponíveis ao sistema produtivo e às novas empresas a serem constituídas nas referidas regiões. Com isso busca-se o almejado desenvolvimento nacional socioespacial mais harmônico, contudo sem desprestigiar os centros existentes nas outras regiões. As empresas e demais instituições, enfim, obteriam a possibilidade de ampliar o seu portfólio com produtos assistivos, podendo aumentar a demanda por recursos humano locais na produção e proporcionado melhor qualidade de vida à população demandante destas tecnologias.

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ONU. A ONU e as Pessoas com Deficiência. Nova York, 2011. Disponível em http://www.onu.org.br/a-onuem-acao/a-onu-e-as-pessoas-om-deficiencia/. Acesso em: 02 abr. 2016.

TARTARUGA, Iván Gerardo Peyré. Inovação, Território e Cooperação: Um Panorama da Geografia Econômica do Rio Grande do Sul. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal do Rio grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, 2014.


1 Doutor em Geografia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Pesquisador do Grupo de Pesquisa de Novas Tecnologias Voltadas à Produção e Divulgação do Conhecimento em Geografia – UERJ. Analista em Ciência e Tecnologia do MCTIC / Instituto Nacional de Tecnologia – INT. Correio eletrônico: marcus.anversa@int.gov.br

Este artículo corresponde a la ponencia presentada en el 35th Conference of Latin American Geographers realizada en San José, Costa Rica del 20 al 22 de mayo del 2018.

2 Está relacionada com a ideia de região, apresentada como um sistema de aprendizagem que, progressivamente, vai sendo melhorado pelas interações entre as Empresas, as ICTs e o Governo. Dentro dessa abordagem, emerge outra, a chamada Região de Aprendizagem (Learning Region), na qual “são destacados o lugar das redes e do associativismo nos processos de desenvolvimento, em geral, e de inovação, em especial, e a ideia de que a inovação é um processo interativo, que ocorre por meio de uma diversidade de rotinas institucionais e convenções sociais” (MORGAN, 1997, apud TARTARUGA, 2014, p. 95).


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